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quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Correio Forense - Crédito do ICMS sobre energia e os supermercados - Direito Tributário

12-09-2010 18:00

Crédito do ICMS sobre energia e os supermercados

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento, por sua Primeira Seção, em recente julgamento de recurso com força de repetitiva, que atividade de panificação e de congelamento de produtos perecíveis não gera direito a crédito de ICMS sobre consumo de energia elétrica, por não configurar operação de industrialização (REsp 1117139/RJ).

Um aspecto relevante desse julgamento é a consolidação da legislação do IPI como base de interpretação para entendimento do conceito de industrialização mesmo para aplicação a outros tributos. A definição é vaga no Código Tributário Nacional (CTN), que dispõe que "considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo" (Parágrafo único do art. 46). Mesmo a lei matriz do IPI (Lei nº 4.502/66) conceitua de forma vaga a operação de industrialização, embora com qualificativos mais delimitadores, referindo-se a "qualquer operação de que resulte alteração da natureza, funcionamento, utilização, acabamento ou apresentação do produto". O Regulamento do IPI (Decreto nº 4.544/2002–RIPI/2002) é mais específico, citando, em caráter exemplificativo, e conceituando cinco modalidades de industrialização.

A consolidação jurisprudencial da legislação do IPI, como base para definição e delimitação do conceito de industrialização para os tributos em geral, é relevante para o afastamento de posicionamentos descabidos, como o intentado pela Receita Federal do Brasil (RFB) através do Ato Declaratório Interpretativo nº 20, publicado no Diário Oficial da União do dia 14 de dezembro de 2007. Dispunha, por esse ato, a RFB que, para fins da apuração do IRPJ e da CSLL, considera-se prestação de serviço as operações de industrialização por encomenda, quando, na composição do custo total do produto industrializado por encomenda, houver a preponderância dos custos dos insumos fornecidos pelo encomendante em relação à mão de obra e insumos do fornecedor. A descaracterização da operação como de industrialização visava forçar as empresas atingidas a elevar a base presumida daqueles tributos de 8% para 32%. O Fisco, nesse caso, cedeu à pressão generalizada contra a arbitrariedade, e voltou atrás.

Merece reparos, contudo, a aplicação da legislação do IPI, pelo STJ, ao caso da atividade de panificação exercida por supermercados. O afastamento do conceito de industrialização por aquela Corte repousa em premissas que não combinam totalmente com a legislação que adota como fundamento.

Um dos argumentos que embasam o entendimento é que o RIPI/2002 (artigo 5º-I.a) exclui do conceito de industrialização o preparo de produtos alimentares, destinados à venda direta a consumidor, em confeitarias e padarias, além de outros locais. Um requisito, contudo, para exclusão do conceito de industrialização é que o produto não seja disponibilizado em embalagem de apresentação, mas em mera embalagem de transporte. Não basta, pois, para descaracterização do conceito jurídico de industrialização, que o preparo se dê no setor de panificação, confeitaria ou padaria do supermercado. Se o produto é resultante de um processo de transformação de matéria-prima, situa-se no campo de tributação do IPI, mesmo que à alíquota zero ou como isento, e é vendido em embalagem de apresentação, não foge do conceito de produto industrializado. A embalagem é de apresentação se é própria para venda do produto a consumidor, tendo bom acabamento e rotulagem de conteúdo promocional, visando valorizar o produto em razão da qualidade ou utilidade adicional, conforme se depreende do artigo 6º do RIPI/2002. Dessa forma, conclui-se que não se pode generalizar o afastamento do conceito de industrialização para os produtos resultantes do processo de panificação dos supermercados.

Estranhamente o STJ adota, como um dos fundamentos para descaracterização da operação como de industrialização, a tese, defendida pelo tribunal de origem do Recurso Especial, de que "ainda que se vislumbre, em alguns setores, a transformação de matéria-prima e o aperfeiçoamento de produtos destinados ao consumo, seu desempenho possui caráter secundário no plano empresarial, focado, essencialmente, na comercialização de bens de consumo`. Isso quer dizer que, mesmo que o processo de preparo do produto seja, na realidade, de transformação, não é juridicamente transformação se tratar-se de atividade secundária do estabelecimento. Não há possibilidade de se extrair da legislação do IPI, confirmada pelo próprio tribunal como base para definição do conceito de industrialização, o critério de prevalência da atividade do estabelecimento como um dos requisitos para a configuração da operação como tal. Pelo contrário, pode-se deduzir do parágrafo único do artigo 4º do RIPI/2002 que o fato de o processo inserir-se em uma atividade preponderante ou em uma atividade secundária do estabelecimento é irrelevante para configuração da operação como industrialização. Assim diz aquele dispositivo: "São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados.`

Pode-se concluir, de acordo com a legislação do IPI, base para interpretação da matéria, e em desacordo com o posicionamento do STJ, que, se, em decorrência de um processo de transformação, surgiu um produto novo, para venda em embalagem de apresentação, ficou juridicamente caracterizada a figura da industrialização. Diga-se o mesmo para outras operações listadas pelo RIPI/2002, como a alteração da embalagem original do produto.

Os supermercados ainda não perderam definitivamente a batalha. A questão terá deslinde final no Supremo Tribunal Federal, que, em 22.10.2009, reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário 588.954/SC, com tema idêntico. E o tema não interessa apenas aos supermercados, mas também aos hipermercados, pequenos mercados, padarias, confeitarias e restaurantes.

Autor: Milton Carmo de Assis

Advogado tributarista, sócio da Assis Advocacia

Fonte: Correio Braziliense


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