3/12/2010
Novo presidente do TCU, Benjamin Zymler afirma que solicitações para interromper obras diminuíram
O presidente eleito do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Benjamin Zymler, irá tomar posse no cargo na próxima quarta-feira. Ele substituirá Ubiratan Aguiar, que esteve no posto nos últimos dois anos. Zymler veio a Porto Alegre nesta quinta-feira para participar de evento sobre controle público, no Tribunal de Contas do Estado. Em entrevista ao Jornal do Comércio, antes de sua palestra, ele projetou uma boa relação com o governo da presidente eleita Dilma Rousseff (PT).
Destacou, ainda, o trabalho do TCU, cujas observações em relação a obras públicas resultaram na economia de R$ 2,6 bilhões aos cofres federais de janeiro a agosto de 2010. E comentou a fiscalização aos empreendimentos públicos para a Copa do Mundo de 2014.
Zymler é o primeiro presidente do TCU com caráter técnico, tendo iniciado a carreira no tribunal como auditor e nomeado ministro-substituto em 2001. O tribunal é composto por nove ministros, sendo três indicados pelo Senado, três pela Câmara dos Deputados e três pelo presidente. Destes, dois são funcionários de carreira, perfil no qual se enquadra o ministro.
Jornal do Comércio - O presidente Lula travou um embate com o TCU para que as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não fossem paralisadas. Como será a relação do TCU com a presidente eleita Dilma Rousseff, que também tem perfil desenvolvimentista?
Benjamin Zymler - Vemos essa relação com muito otimismo. Há uma percepção, tanto por parte do tribunal, quanto pelo governo, de que o controle é uma parceria, e que o governo pode se beneficiar da ação do tribunal. E o TCU também depende do governo para que o controle seja feito. Estive conversando com Dilma e acho que os caminhos estão abertos para esse entendimento. O TCU tem uma posição de autonomia em relação aos Poderes, mas ao mesmo tempo reconhece a complexidade do objeto controlado. Dilma conhece o TCU como ninguém e reconhece a qualidade do nosso trabalho.
JC - O senhor defende uma autonomia maior do tribunal em relação ao governo?
Zymler - Depois da Constituição de 1988, o tribunal trilhou um caminho de conquista de autonomia. Entendemos que podem ocorrer problemas, nem sempre acertamos. O governo também percebe que essa interação é construtiva. E a perspectiva é de uma compreensão entre governo e tribunal, cada um dentro de suas competências.
JC - Então, o senhor considera boa a relação com o governo Lula, apesar das discordâncias em relação às obras do PAC?
Zymler - O ambiente com o governo é o melhor possível. Muitas vezes o governo é duro, e tem que ser assim. Isso gera algum tipo de problema pontual. Mas na perspectiva geral, houve melhoria da gestão do governo, percebida pelo TCU. Na fiscalização de obras públicas, há alguns anos sugeríamos ao Congresso a paralisação de 120 obras. Hoje sugerimos a paralisação de apenas 30, o que significa que a gestão dos contratos de obras públicas no País melhorou. E essa evolução é o efeito da parceria entre tribunal e governo.
JC - Quais são os desafios para o próximo governo?
Zymler - É um grande desafio viabilizar investimentos em infraestrutura para possibilitar o crescimento econômico. Por isso, temos que tornar o Brasil um País atraente para o setor privado nacional e internacional. O governo, com recursos públicos, não é capaz de implementar as obras necessárias para o desenvolvimento. E nesse ponto o TCU contribui para tornar o País mais confiável para o investimento privado. Analisamos todas as concessões, verificamos as deficiências dos projetos, solicitamos ao governo alterações. Esse é um exemplo de como o controle de parceria é fundamental para a melhoria da economia.
JC - E que avanços podem ser obtidos na transparência?
Zymler - A transparência é um pressuposto para o controle. E o Brasil evoluiu muito na transparência das contas públicas. Temos um portal (na internet, o Portal da Transparência) que é exemplo mundial. Mas temos que evoluir, tem que ser irradiado para os outros Poderes e se tornar algo absolutamente normal na administração pública. O gestor público deve ter consciência de que a publicidade é fundamental e o sigilo só se impõe em casos extremados. Então, vamos ver, nos próximos anos, uma evolução exponencial do nível de transparência nas contas.
JC - Há alguma mobilização especial do TCU em relação à Copa do Mundo?
Zymler - O tribunal designou o ministro Valmir Campello para coordenar o sistema de controle das obras vinculadas à Copa, tanto de infraestrutura quanto de estádios. As obras de mobilidade urbana são feitas com recursos federais, por isso controlamos. As dos estádios são feitas pelos estados e pela iniciativa privada. O tribunal somente controla o financiamento, se existir, do Bndes e da Caixa Econômica Federal. Mas o ministro Campello exerce uma espécie de supervisão das ações. Estamos acompanhando e, em alguns casos, recomendando a órgãos federais e ao Ministério dos Esportes a adoção de medidas para que o planejamento possa ser feito adequadamente.
JC - Houve algum desafio extra, devido à complexidade das parcerias?
Zymler - Sem dúvida. O Brasil é uma federação complexa, portanto essas ações de coordenação também são complexas, assim como o controle sobre elas. O tribunal exerce funções de coordenação e de supervisão e, no que diz respeito a obras federais, exerce o controle pleno. Ou seja, não podemos controlar a aplicação de recursos estaduais ou da iniciativa privada. Isso cabe aos tribunais estaduais.
JC - Os tribunais de contas estaduais estão preparados para esse controle?
Zymler - Não conheço a situação de cada um deles. Mas temos tribunais de nível elevado, e cito o do Rio Grande do Sul como exemplo de qualificação técnica de seus quadros e de decisões sempre muito bem fundamentadas. Existe uma assimetria entre os tribunais. O interesse do TCU é ajudar na qualificação de todos. Por isso, para as obras da Copa, disponibilizaremos cursos de treinamento aos técnicos dos órgãos estaduais.
JC - O senhor é o primeiro ministro com perfil técnico a assumir a presidência do TCU. Como o senhor avalia esse fato?
Zymler - É a primeira vez que um ministro-substituto, que posteriormente chega a ministro, alcança a presidência do TCU. Há um simbolismo nisso. Mostra que o tribunal tem espaço para a meritocracia, para a qualificação. É possível chegar à presidência sendo levado pela carreira técnica, por concurso público. Dessa hibridização entre ministros escolhidos pelo Parlamento e de perfil técnico é que nasce a força do tribunal. Passei por todos os cargos do tribunal e sei que a meritocracia é a sua linha mestra. Na minha presidência, escolherei meus secretários de controle externo pela sua qualificação.
Luana Fuentefria, especial para o JC
ANA PAULA APRATO/JC
Jornal do Comércio
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