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quinta-feira, 12 de abril de 2012

Correio Forense - João Pessoa(PB): Justiça Eleitoral cassa mandato do vereador Felipe Leitão por compra de votos - Direito Eleitoral

11-04-2012 08:40

João Pessoa(PB): Justiça Eleitoral cassa mandato do vereador Felipe Leitão por compra de votos

O juiz da 64ª Zona Eleitoral de João Pessoa (PB), Eslu Eloy Filho, julgou procedente a ação de investigação judicial eleitoral proposta pelo Ministério Público Eleitoral cassando o diploma do vereador Felipe Matos Leitão, bem como, declarando a sua inelegibilidade pelo prazo de 03 (três) anos, e multa de 50 mil URFIS. O fundamento da sentença é reconhecendo a prática de condutas previstas nos arts. 30-A e 41-A, da Lei nº 9.504/97, ou seja, gastos ilícitos em campanha eleitoral, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, na eleição municipal da Capital paraibana, em 2008.

 A ação tinha sido proposta pelo então promotor de justiça Amadeus Lopes Ferreira diante do comparecimento de dezenas de pessoas no fórum eleitoral reclamando que o vereador tinha oferecido dinheiro para votar nele, mas que após o pleito eles não tinha recebido nenhum valor.

 Foi instaurado inquérito pela Polícia Federal, e após quase quatro anos de tramitação o processo chega ao fim no âmbito do primeiro grau.

 Na decisão, o juiz Eslu Eloy Filho afirma que “estando comprovado que determinada pessoa, agindo em nome e com a aquiescência do investigado, infiltrava-se em comunidades, cooptava lideranças e eleitores para, sob promessa de pagamento em dinheiro, nele votarem, caracterizada resta a captação ilícita de sufrágio e o abuso do poder econômico, com potencialidade suficiente para desequilibrar o pleito”.

 O promotor de justiça Amadeu Lopes Ferreira, afirmou na petição inicial, em síntese, que o investigado, em conluio com seu aliado, IOMAR RODRIGUES DOS SANTOS, conhecido também como “VOTINHO DE OURO” ou “RODRIGO”, promoveu um esquema de compra de votos nas eleições municipais de 2008, cooptando lideranças de diversos bairros desta capital, na maioria de baixa renda, sob promessa de pagamento de R$ 200,00 (duzentos reais) visando o aliciamento de eleitores, aos quais era prometido o valor de R$ 70,00 (setenta reais) para votarem naquele.

 Alega, ainda, que após o dia 05 de outubro daquele ano, precisamente no dia 07, a Promotoria Eleitoral fora invadida por cerca de 100 pessoas que foram reclamar revoltadas, porque haviam votado no investigado, mas não receberam a quantia prometida, resultando na instauração de procedimento administrativo eleitoral nº 011/2008, com a tomada dos depoimentos e colheita de outros elementos.

 Assim, afirmando que esses fatos comprometeram a normalidade do pleito e afetaram a legitimidade da eleição do investigado, apontou infração aos arts. 30-A e 41-A, da Lei nº 9.504/97 e art.22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/91 e pediu a procedência da ação para, reconhecendo-se a arrecadação e gastos ilícitos em campanha eleitoral, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder político e econômico, decretar-se as penas de multa e inelegibilidade do investigado por 03 (três) anos, além da pena de cassação do seu diploma.

 

Veja a sentença na íntegra:

  

JUSTIÇA ELEITORAL

64ª ZONA ELEITORAL-JOÃO PESSOA-PB

AIJE Nº 008/2008

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

INVESTIGADO: FELIPE MATOS LEITÃO

ADVOGADO: FÁBIO BRITO PEREIRA

INCIDÊNCIA: ARTS.41-A e 30-A, ambos da Lei nº 9.504/97, art.22, inciso XIV, LC nº. 64/90.

 

AIJE. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS EM CAMPANHA. ARTS.41-A e 30-A, LEI Nº 9.504/97. Preliminares de ofensa ao princípio da isonomia e ampla defesa. Rejeição. Prova robusta da captação ilícita do sufrágio e abuso de poder econômico. Potencialidade e desequilíbrio do pleito. Procedência. Cassação do diploma. Inelegibilidade. Multa.

 

- Não ofende ao princípio da isonomia o fato de o MPE ter requerido diligências, sem oitiva da defesa, máxime quando, na sua maioria, foram indeferidas, ausente o prejuízo.

 

- Sendo o juiz o destinatário da prova, a este cabe indeferir as diligências inúteis ou protelatórias (art.130, CPC).

 

- A prova emprestada colhida em investigação, mediante autorização judicial, pode ser utilizada para instruir outros procedimentos envolvendo a mesma parte, garantindo-se, nestes, o contraditório e a ampla defesa.

 

- Estando comprovado que determinada pessoa, agindo em nome e com a aquiescência do investigado, infiltrava-se em comunidades, cooptava lideranças e eleitores para, sob promessa de pagamento em dinheiro, nele votarem, caracterizada resta a captação ilícita de sufrágio e o abuso do poder econômico, com potencialidade suficiente para desequilibrar o pleito.

 

Vistos, etc...

 

Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida pelo MPE contra o investigado, Vereador FELIPE MATOS LEITÃO, contra quem é imputada a prática de captação ilícita de sufrágio, prevista no art.41-A, da Lei nº 9.504/97, captação e gastos ilícitos de recursos em campanha eleitoral, previstos no art.30-A, da mesma lei, além de abuso de poder político e econômico, na forma do art.22, Lei Complementar nº 64/90.

 

Aduz o autor, em síntese, que o investigado, em conluio com seu aliado, IOMAR RODRIGUES DOS SANTOS, conhecido também como “VOTINHO DE OURO” ou “RODRIGO”, promoveu um esquema de compra de votos nas eleições municipais de 2008, cooptando lideranças de diversos bairros desta capital, na maioria de baixa renda, sob promessa de pagamento de R$ 200,00 (duzentos reais) visando o aliciamento de eleitores, aos quais era prometido o valor de R$ 70,00 (setenta reais) para votarem naquele.

 

Alega, ainda, que após o dia 05 de outubro daquele ano, precisamente no dia 07, a Promotoria Eleitoral fora invadida por cerca de 100 pessoas que foram reclamar revoltadas, porque haviam votado no investigado, mas não receberam a quantia prometida, resultando na instauração de procedimento administrativo eleitoral nº 011/2008, com a tomada dos depoimentos e colheita de outros elementos.

 

Assim, afirmando que esses fatos comprometeram a normalidade do pleito e afetaram a legitimidade da eleição do investigado, apontou infração aos arts. 30-A e 41-A, da Lei nº 9.504/97 e art.22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/91 e pediu a procedência da ação para, reconhecendo-se a arrecadação e gastos ilícitos em campanha eleitoral, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder político e econômico, decretar-se as penas de multa e inelegibilidade do investigado por 03 (três) anos, além da pena de cassação do seu diploma.

 

Acostou o procedimento nº 011/2008 contendo vários depoimentos (fls.20/80).

 

Recebida a inicial, o investigado foi citado e ofereceu defesa alegando, em resumo, que o principal responsável pelas práticas seria Lamarck Leitão, seu primo e inimigo, o qual, juntamente com Iomar ou Votinho de Ouro, montou toda a trama para prejudica-lo porque não recebeu apoio político de sua família para as eleições de 2008. Justificou que sua votação expressiva em vários bairros deveu-se ao prestígio político de seu tio e pai perante o eleitorado desta cidade, bem como a visita a diversas residências num verdadeiro “corpo-a-corpo”. Reclamou que as provas acostadas foram extraídas de procedimentos administrativo e policial não submetidos ao contraditório. Protestou por provas que especificou e pediu a improcedência (fls.158/172). Juntou documentos (fls.173/227).

 

Em audiência foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo MPE, as do juízo e da defesa (fls.232/246.296/297.302/305,330/335).

 

Encerrada a fase de dilação probatória, o juiz eleitoral, à época, proferiu despacho deferindo em parte as diligências do investigado (fls.338/339).

 

O MPE, mesmo sem vista, requereu fossem cumpridas as diligências requeridas pela defesa, sendo deferido o pedido (fls.350v).

 

Acostados os documentos referentes às diligências, a chefia de zona certificou o cumprimento da determinação (fls.353/399).

 

     Com vistas, o MPE ao invés de elaborar as razões finais, requereu diligências para reinquirição de testemunhas e a possibilidade de acareações entre elas, mas o ilustre juiz eleitoral as indeferiu com fundamento no art.130, do CPC por entender desnecessárias (fls.400v/403).

 

     MPE, mais uma vez, não apresentou alegações finais, limitando-se a pedir reconsideração do despacho que indeferiu as diligências (fls.404/404v).

 

     Assumindo a zona novo Promotor Eleitoral, este desistiu das diligências requeridas pelo colega, solicitando apenas a juntada do resultado da votação obtida pelo investigado e Lamarck Leitão, individualizada por zonas e seções (fls.405/405v/420v).

 

     Deferida a diligência, as cópias foram acostadas (fls.408/420).

 

     Nas suas razões finais, o MPE, após analisar a prova, pede a procedência da ação (fls.423/429).

 

     O investigado, por sua vez, nas suas alegações derradeiras, arguiu preliminares de ofensa ao princípio da isonomia; ofensa ao princípio da ampla defesa pela ausência de produção de provas já deferidas pelo juízo e também pela utilização de prova emprestada oriunda de inquérito policial sem o contraditório. No mérito, pediu a improcedência da lide por ausência de prova cabal acerca do envolvimento do investigado com os fatos, estes atribuídos a seu primo e inimigo Lamarck Leitão (fls.436/481).

 

     Por motivo superveniente e de foro íntimo, o juiz titular desta Zona, Dr. Fabiano Moura de Moura, averbou-se suspeito, tendo o Egrégio TRE-Pb feito a designação deste magistrado para assumir a presidência do fito (fls.483/488).

 

     Houve redistribuição do processo para a 77ª Zona Eleitoral, onde sou titular, mas o MPE que ali atua requereu a devolução dos autos à 64ª Zona Eleitoral, uma vez que a suspeição era do juiz e não do juízo (fls.494).

 

     O investigado atravessou petição requerendo o cumprimento das diligências que havia requerido e foram deferidas, mas não cumpridas integralmente (fls.495/499).

 

     Proferi despacho determinando o retorno dos autos à 64ª Zona Eleitoral, vindo-me conclusos para decisão.

 

      Este, o relatório.

 

DILIGÊNCIAS REQUERIDAS PELO INVESTIGADO

 

O pedido de diligências formulado pelo investigado às fls.495/500, confunde-se com uma das preliminares arguidas nas alegações finais, por isso será decidido quando de sua apreciação.

 

PRELIMINARES

 

I – Ofensa ao princípio da isonomia processual.

 

     Alega o investigado que a contar do dia 04.05.2009 até 09.09.2011, data em que fora intimado para apresentar suas razões finais, ou seja, durante dois anos, “a condução do processo se restringiu a um verdadeiro diálogo travado entre o Parquet Eleitoral e o Juiz da causa”, permitindo-se ao primeiro a oportunidade de requerer novas diligências, obter vista dos autos e falar sobre documentos, sem que igual tratamento fosse garantido à defesa.

 

     É verdade que a partir das fls.400v até às fls.420v, houve sucessivas manifestações do MPE requerendo várias diligências, inclusive o cumprimento das que foram solicitadas pela defesa, além de reinquirição de testemunhas, acareações e juntada de documentos, mas quase todas foram indeferidas, à exceção daquelas que já haviam sido requeridas pelo investigado e a juntada do resultado de sua votação por seção e zona eleitoral.

 

     Registre-se que a única manifestação do MPE acolhida foi a juntada do resultado da votação do investigado. E esse documento, além de ser, obviamente, do seu conhecimento, nenhum prejuízo lhe trouxe com sua anexação os autos. Aliás, sequer reclama do seu teor nem diz em que consistiria o gravame.

 

     Assim, não houve ofensa ao princípio da isonomia.

 

     Rejeito a preliminar.

 

II – Ofensa ao princípio da ampla defesa pela ausência de produção de provas já deferidas.

 

Devo dizer que as diligências requeridas pelo investigado não se mostram pertinentes nem indispensáveis ao julgamento da lide.

                   

O pedido de degravação das interceptações telefônicas entre Iomar (“Votinho de Ouro” ou Rodrigo) e várias pessoas já se encontra nos autos às fls.353/362;361/397, extraída do inquérito policial respectivo, no qual, aliás, o investigado fora indiciado.

 

Ademais, se o investigado teve acesso ao áudio dos diálogos ou este ficou à sua disposição, desnecessária a degravação. Como disse o Min. Eros Graus, no julgamento do RCED nº 671 – São Luís/MA, “Permitido o acesso à mídia de áudio e vídeo, torna-se não necessária sua transcrição. Precedentes.”

 

Por outro lado, a prova testemunhal fez expressa referência às reuniões dirigidas por Iomar, de sorte que a produção de outra prova a respeito desse fato é meramente protelatória.

 

No mais, a certidão de fls.399, da chefia desta zona, é esclarecedora no sentido de demonstrar que todas as diligências requeridas pela defesa foram atendidas.

 

Não bastasse, sendo o juiz o destinatário da prova e encontrando nos autos elementos suficientes para formar seu convencimento acerca da matéria em julgamento, como é o caso, compete-lhe indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art.130, CPC).

 

Destarte, indefiro as diligências e rejeito a preambular.

 

III – Violação ao princípio da ampla defesa em decorrência da utilização de prova emprestada oriunda de inquérito policial sem o devido traslado.

 

     Mais uma vez sem razão o investigado.

 

     Embora a ação tenha sido instruída com depoimentos colhidos em processo inquisitório ou investigativo, de forma unilateral, a título de indícios, todos os depoimentos prestados, tanto perante o MPE quanto junto à autoridade policial, foram submetidos ao crivo do contraditório com a participação do investigado, devidamente assistido por seu advogado, garantindo-se, assim, a ampla defesa e utilização dos recursos a ela inerentes.

 

     As peças extraídas do inquérito policial nº 786/2008, no qual o investigado figura como indiciado, foram trazidas aos autos a pedido dele próprio, a título de diligências, não podendo agora valer-se de sua torpeza para rechaçar esses elementos, dizendo imprestáveis.

 

     Além do mais, as peças acostadas são áudios de diálogos, degravações e informações decorrentes de interceptações telefônicas e quebra de sigilo bancário, autorizadas judicialmente, não se lhes podendo impor a pecha de ilícitas.

 

     A propósito do tema, o STF tem precedentes no sentido de autorizar o uso da prova emprestada, colhida em investigação criminal, noutros procedimentos, de natureza diversa, desde que envolvidas as mesmas pessoas.

 

     Confira-se questão de ordem no inquérito nº 2.424, da relatoria do Ministro Cesar Peluso, na qual ficou assentado:

 

EMENTA: PROVA EMPRESTADA. Penal. Interceptação telefônica. Escuta ambiental. Autorização judicial e produção para fim de investigação criminal. Suspeita de delitos cometidos por autoridades e agentes públicos. Dados obtidos em inquérito policial. Uso em procedimento administrativo disciplinar contra os mesmos servidores. Admissibilidade. Resposta afirmativa à questão de ordem. Inteligência do art.5º, Inc.XII, da CF, e do art.1º, da Lei federal nº 9.296/96. Voto vencido. Dados obtidos em interceptações de comunicações telefônicas e em escutas ambientais, judicialmente autorizadas para produção de prova em investigação criminal ou em instrução processual penal, podem ser usadas em procedimento administrativo disciplinar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidas.” (DJ, 24.08.2007).

 

     Consulte-se também acórdão da relatoria do Min. Marco Aurélio, no RMS nº 24.956, abordando tema idêntico.

 

     Na seara do direito eleitoral, o TSE, no julgamento do RO nº 11.596/MG, da relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, firmou entendimento acerca do alcance da prova emprestada a ser utilizada em procedimento diverso:

 

“NULIDADE ABSOLUTA DO PROCESSO. INEXISTÊNCIA. LICITUDE DA PROVA. A nulidade absoluta do processo por ilegitimidade da prova, deve ser rejeitada, porque: a) a prova, produzida na intimidade de investigação, realizada em conjunto pelo Ministério Público Federal, Polícia Federal e Receita Federal, é legítima e passível de ser compartilhada; b) essa prova, quando licitamente rompida a intimidade das ligações telefônicas por ordem judicial, fundamentada no permissivo constitucional, pode ser utilizada por outros órgãos do Estado para instruir procedimentos diversos; c) o direito à privacidade de informações não é absoluto nem ilimitado, mormente quando se contrapões à tutela de interesse coletivo previsto pela Constituição Federal...”

 

No mesmo sentido acórdão proferido no RO nº 2364-PB, da relatoria do Ministro Marcelo Ribeiro (DJE, 10.05.2010).

 

Ademais, todo o acervo existente nos autos foi levado ao conhecimento do investigado e este teve a oportunidade de se contrapor às provas encartadas, nas épocas próprias, seja na defesa inicial, seja nas alegações finais ou mesmo na primeira oportunidade em que, de forma subsequente, falou no processo, assegurando-se assim o direito ao contraditório e ampla defesa.

 

Dessa forma, repilo a preambular.

 

MÉRITO

 

No mérito, a lide é procedente.

 

Cuida-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida pelo MPE contra o investigado, Vereador Felipe Matos Leitão, contra quem é imputada a prática de captação ilícita de sufrágio, prevista no art.41-A, da Lei nº 9.504/97, arrecadação e gastos ilícitos de recursos em campanha eleitoral, previstos no art.30-A, da mesma lei, além de abuso de poder político e econômico, na forma do art.22, Lei Complementar nº 64/90.

 

A prova carreada no decorrer da demanda comprova, extreme de dúvida, as condutas atribuídas ao investigado.

 

A verdade que desponta dos elementos encartados nos autos é de que Iomar Rodrigues dos Santos, conhecido pela alcunha de “Votinho de Ouro” ou Rodrigo, nome com o qual se apresentava em algumas comunidades, trabalhou em prol do investigado, agindo em seu nome na captação ilícita de sufrágios, visando sua eleição para o cargo de Vereador na Câmara Municipal desta cidade, nas eleições de 2008.

 

As testemunhas arroladas pelo MPE na inicial, assim como as do juízo, confirmaram, com riqueza de detalhes, no crivo do contraditório, o que haviam dito anteriormente, no sentido de que “Votinho de Ouro” ou Rodrigo, comparecia em diversas localidades desta cidade, algumas compostas de pessoas de baixa renda, arregimentando eleitores para, sob promessa de recompensa financeira, votarem no investigado.

 

Havia até um esquema para cooptar pessoas como “líderes” ou “lideranças”, as quais, por sua vez, tinham a missão de conseguir outros eleitores, elaborando lista contendo informações sobre títulos e seções em que iriam votar, tudo para efeito de, segundo aquele afirmava, serem monitorados através do seu “laptop”.

 

Pela execução desse trabalho, cada liderança recebia R$ 200,00 (duzentos reais) por listagem contendo o nome de 25 (vinte e cinco) eleitores, sendo que estes, a seu turno, recebiam a promessa de pagamento do valor de R$ 70,00 (setenta reais) pela venda do voto.

 

Afora esses personagens, existia ainda a figura dos “aviõezinhos”, pessoas destinadas a recolher os comprovantes de votação (tickets) dos eleitores e entrega-los às lideranças até às onze horas da manhã do dia da eleição, deixando-os aptos a receberem a recompensa financeira prometida.

 

Para implementação desse plano, consistente na arregimentação de pessoas e promessas de vantagem financeira, eram feitas reuniões nas residências de várias lideranças e nelas sempre se fazia presente “Votinho de Ouro” ou “Rodrigo”, às vezes até portando “duas malas, uma de cor vermelha e outra de cor verde, repleta de dinheiro em espécie, numa demonstração de que o dinheiro seria para pagamento das lideranças e dos eleitores...”, como esclareceu Sheila Peixoto de Oliveira, uma das lideranças que foi ouvida como testemunha do juízo (fls.332/333).

 

Os depoimentos das testemunhas Lúcia Mendes da Silva, Antônia Bento dos Santos, Miriam Salustiano dos Santos, Gileade Gomes de Medeiros, Tereza Cristina Belarmino dos Santos, Edlane Peixoto de Oliveira e Luís Francisco da Silva, são todos nesse sentido (fls.232/233,234,236,237,240,246,334,335).

 

Um dos principais personagens dessa cadeia ardilosa e criminosa, Iomar Rodrigues dos Santos, o “Votinho de Ouro” ou “Rodrigo”, quando ouvido em juízo tentou desviar o foco da questão para a pessoa de Lamarck Leitão, primo do investigado, dizendo ter sido contratado por ele para tentar prejudicar este, pois eram inimigos.

 

Segundo Iomar, como Lamarck não conseguiu dinheiro para comprar voto em favor de sua candidatura, utilizou um plano “B” no sentido de pedir ao primeiro para distribuir santinhos do investigado e arregimentar eleitores sob promessa do pagamento de R$ 70,00 (setenta reais) para votar nele (fls.244/245).

 

Ouvido sobre os fatos, Lamarck desmentiu completamente a assertiva apresentada por Iomar, dizendo que este sequer chegou a trabalhar em seu favor, embora tenha sido procurado nesse sentido, acreditando, segundo informações da mídia, que ele “trabalhou para Felipe Leitão”, seu primo, esclarecendo que “em momento algum foi levantada a hipótese de pedir voto em nome do declarante no sentido de prejudicar a candidatura de Felipe Leitão até mesmo porque o declarante era candidato...” (fls.241/242).

 

Com relação a possíveis inimizades entre Lamarck, o investigado e o pai deste, o primeiro foi taxativo em afirmar “que não tem nada contra o investigado e o pai deste...” e em “nenhum momento ocorreu divergência política entre o declarante, Felipe e Mikika Leitão...” (fls.242).

 

De fato, a versão de Iomar, “Votinho de Ouro” ou “Rodrigo” é absurda, inverossímil e não se sustenta diante dos fatos e da lógica da própria política. Ora, como poderia Lamarck Leitão, que disputava com o investigado uma vaga na Câmara Municipal, contratar alguém para pedir votos e arregimentar pessoas para votar em favor do seu concorrente, visando exclusivamente prejudica-lo em caso de vitória?

 

Registre-se que em política vigora a máxima de que “não se pede voto para inimigo ou adversário; tira-se.”.

 

Seria mais lógico e crível tivesse Lamarck contratado alguém para ajuda-lo a se eleger e nunca para favorecê-lo numa hipótese de eventual derrota. Até porque, como ele mesmo disse, também “era candidato”.

 

E se é verdade o que disse Iomar, alegando que Lamarck não tinha dinheiro para o esquema de compra de voto, como justificar que ele tivesse numerário para contratá-lo a fim de impingir um revés ao investigado?

 

Ademais, todas as testemunhas dizem, com segurança, que Iomar, “Votinho de Ouro” ou “Rodrigo” só fazia promessa em troca de voto em favor de “Felipe Leitão”, jamais tendo mencionado o nome de Lamarck nas reuniões.

 

Áudios e degravações de conversas captadas pela polícia federal através de escutas autorizadas judicialmente também revelam que Iomar, após desconfiar que seu telefone estava grampeado, evitou conversar sobre assunto de compra de votos com diversas pessoas. Contudo, quando a ligação partia de Lamarck, aquele insistia nos diálogos e forçava o direcionamento da conversa, num claro propósito de coloca-lo na condição de “bode expiatório”, diante da inafastável certeza da vitória do investigado, como de fato ocorreu.

 

Como bem disse o MPE, não se descarta a hipótese “de que “o golpe” eleitoral teria sido prometido, em extensão também para Lamarck, que ingenuamente acreditou na intenção dos seus parentes e serviu como “bode expiatório”, sendo inclusive preso na operação da Polícia Federal, restando demonstrada uma votação irrisória (303 votos) e injustificável para configuração da captação ilícita dos sufrágios.” (fls.426).

 

Isso porque esse mesmo esquema fora utilizado por Mikika Leitão, pai do investigado, juntamente com Iomar ou “Votinho de ouro”, nas eleições de 2006, na cidade de Campina Grande-Pb, quando disputou o cargo de Deputado Federal, ocasião em que Lamarck trabalhou em seu favor. Seria uma retribuição a esse trabalho que, no entanto, não ocorreu (fls.241/243).

 

De acordo com a lei, a captação ilícita de sufrágio, consoante dicção do art.41-A, da Lei nº 9.504/97, consiste em “doar, oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza”.

 

Para a caracterização do ilícito, é ponto pacífico na doutrina e jurisprudência não ser necessário aferir-se a potencialidade de a conduta praticada provocar um desequilíbrio na disputa e afetar o resultado da eleição, pois o bem jurídico tutelado é a liberdade de escolha do eleitor e a lisura do pleito (REspe 27.737/PI, Min.José Delgado, AgR-REspe 27.104/PI, Min. Marcelo Ribeiro, REspe 26.118/MG, Min. Gerardo Grossi, REspe 25.064/AM, Min. Luiz Carlos Madeira, entre outros).

 

No entanto, indispensável averiguar a participação, direta ou indireta, do investigado, ou mesmo sua aquiescência com os fatos narrados nesta ação, a indicar o liame entre estes e sua candidatura.

 

Ora, é voz unânime em todos os depoimentos das pessoas ouvidas, a pedido do MPE e como testemunhas do juízo, que o indivíduo Iomar, também conhecido como “Votinho de Ouro” ou “Rodrigo”, apresentava-se nas comunidades, arregimentava lideranças e eleitores sob promessa de pagamento de recompensa em dinheiro, com pedido expresso para votarem na pessoa do investigado, consoante se observa do conteúdo dos testemunhos de fls. 232/233,234,236,237,240,332/333,334/335, colhidos, repita-se, sob o crivo do contraditório e sem qualquer contradita ao compromisso dos depoentes. Logo, insuspeitos.

 

Indiscutível, pois, que Iomar agia em nome do investigado ou, no mínimo, com sua aquiescência, influindo na vontade dos eleitores para captar os votos em benefício de sua candidatura.

 

Certo que o investigado não se fazia presente nas reuniões. E nem precisava, porquanto esse trabalho era tarefa para “Votinho de Ouro”, a quem cabia infiltrar-se nas inúmeras comunidades desta capital. Ao primeiro interessava o resultado das ações, vale dizer, a captação da vontade dos eleitores sob a promessa da obtenção de vantagem financeira, em prol de sua candidatura.

 

Mas é matéria pacífica, na jurisprudência do TSE, segundo palavras do Min. Enrique Ricardo Lewandowski, que a “A interpretação dada por esta Corte ao art.41-A da Lei 9.504/1997 é que a captação ilícita de votos independe da atuação direta do candidato e prescinde do pedido formal de voto. Nesse sentido, os seguintes precedentes: AgR-AI 7.515/PA, Rel. Min. Caputo Bastos, AgR-Respe 28.061/RN, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, RCED 616/AC, Rel. Min. José Delgado...” (RO-1589-RJ, DJE 01.02.2010, pág. 419).

 

Assim, está evidenciada, à saciedade, a infringência ao art.41-A, da Lei nº 9.504/97, por parte do investigado, surgindo, com consequência, a cassação do seu diploma e aplicação de multa.

 

Além da captação ilícita de sufrágio, também desponta latente, no acervo amealhado no curso da lide, um enorme abuso de poder econômico, com reflexos e influência no resultado do pleito.

 

Já se viu que é fato incontroverso nos autos, de acordo com as provas colhidas, que “Votinho de Ouro” agia em nome e em benefício da candidatura do investigado, com sua aquiescência, cooptando lideranças e eleitores para, sob promessa de vantagem financeira, votarem nele.

 

Em reuniões realizadas nas casas de lideranças, Iomar se apresentava “com duas malas, sendo uma de cor vermelha e outra de cor verde, repleta de dinheiro em espécie, numa demonstração de que o dinheiro seria para pagamento das lideranças e eleitores...”,conforme declarou Sheila Peixoto de Oliveira, no depoimento prestado às fls.332/333.

 

Esse fato é coonestado, de alguma maneira, pelo depoimento de Lúcia Mendes da Silva, ao afirmar que “Iomar chegava com uma mala...”. E mesmo a testemunha não tendo visto o seu conteúdo, disse que soube por “terceiras pessoas” “que em tal mala tinha dinheiro...” (fls.232/233).

 

A existência grande quantidade de dinheiro em espécie em poder de Iomar, inclusive no interior de sua residência, destinado à compra de votos, também é revelada através das escutas telefônicas realizadas mediante autorização judicial, sendo constatado num dos diálogos mantidos com sua esposa, Salete, no dia 02.10.2008, no momento que estava sendo abordado pela polícia federal, que dera a ordem para ela tirar o dinheiro de dentro de casa, botar no carro e sair do local, consoante áudio 2008100215144316.wav (fls.387).

 

Esse dinheiro, além de ter sido usado para servir de promessa ou mesmo pagamento na compra de voto, influindo na vontade do eleitor, sem ser, evidentemente, contabilizado na prestação de contas do investigado, caracteriza gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, constituindo-se em abuso de poder econômico, com potencialidade suficiente para afetar o resultado da eleição.

 

De fato, nas comunidades em que residem as pessoas que serviram como testemunhas nesta demanda, a votação do investigado foi expressiva, segundo estatística fornecida pelo TRE-Pb (fls.408/420).

 

Não se perca de vista, porém, que a atuação de “Votinho de Ouro” não se limitou apenas àqueles bairros, isto é, Costa e Silva, Grotão e Mandacarú. Ele atuou também em Cruz das Armas, Boa Esperança, Cabo Branco, Colinas do Sul, Cristo, Gervásio Maia, entre outros, conforme registram os diálogos dos áudios (fls.353/398).

 

A soma da votação obtida nessas localidades totaliza aproximadamente 2.635 (dois mil seiscentos e trinta e cinco) votos, o que corresponde a mais de 50% da votação obtida pelo investigado, no patamar de 4.846 (oito mil oitocentos e quarenta e seis) votos, o bastante para desequilibrar o pleito e afetar o resultado das eleições, comprovando dessa forma que os eleitores cooptados, ainda que alguns deles não tenham recebido o prometido, honraram nas urnas suas promessas ajudando eleger o representado.

 

Incide, portanto, na hipótese, o disposto no art.30-A, da Lei nº 9.504/97.

 

ISTO POSTO, julgo procedente a ação para, reconhecendo a prática de condutas previstas nos arts. 30-A e 41-A, da Lei nº 9.504/97, ou seja, gastos ilícitos em campanha eleitoral, captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico, decretar a cassação do diploma de Vereador do investigado FELIPE MATOS LEITÃO, bem como sua inelegibilidade pelo prazo de 03 (três) anos, a contar da eleição, nos termos do art.22, inciso XIV, da LC nº 64/90.

 

Como multa, considerando a gravidade da conduta e o universo de eleitores alcançados pela promessa ou compra de votos, com a nítida capacidade de influir decisivamente no resultado do pleito, como de fato influiu, ocupando o investigado uma cadeira que seria de outrem que com ele concorreu de forma honesta, ferindo a liberdade de escolha e a legitimidade de seu mandato, aplico o valor correspondente a 50 (cinquenta mil) Ufir’s.

 

Oficie-se à Câmara Municipal de João Pessoa-Pb, à Zona Eleitoral responsável pela diplomação nesta capital e ao TRE-Pb para as providências cabíveis, notadamente os efeitos da inelegibilidade e posse do suplente.

 

Demorados face ao acúmulo de serviços.

 

P.R.I.

 

 João Pessoa/PB, 04 de abril de 2012.

 

ESLU ELOY FILHO

JUIZ ELEITORAL

 

 

Fonte: Redação


A Justiça do Direito Online


Correio Forense - João Pessoa(PB): Justiça Eleitoral cassa mandato do vereador Felipe Leitão por compra de votos - Direito Eleitoral

 



 

 

 

 

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