22/10/2009
Ministro Maurício Godinho defende regulamentação como saída para a crise
A crise econômica mundial dos dois últimos anos trouxe, na avaliação do ministro Maurício Godinho Delgado, do Tribunal Superior do Trabalho, uma lição fundamental: o ideário da desregulamentação exacerba problemas e distorções e acentua o processo de exclusão social. A intervenção é um bem para o capitalismo, como o remédio para o doente. O capitalismo sem intervenção é um ser contraditório, irracional e suicida, além de assassino, porque sai liquidando países, afirmou o ministro na segunda-feira (19), em palestra na Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). Para Maurício Godinho, a maneira encontrada pelo sistema econômico para superar a crise foi justamente o restabelecimento de mecanismos de regulação, por meio de um processo maciço de intervenção do Estado na economia.
A palestra teve como público um grupo de 51 juízes do trabalho recém-empossados, que participam, em Brasília, de Curso de Formação Inicial da Enamat. O tema escolhido O Direito do Trabalho e a Crise Econômica Atual - não é um tema jurídico, explicou ele aos alunos-juízes. Tratamos propriamente dos fundamentos da existência do Direito do Trabalho, procurando trazer o debate para o contexto da crise econômica que vivenciamos. E a crise criou uma oportunidade excepcional de reflexão sobre as instituições, o Estado, a democracia e o direito, particularmente os direitos sociais entre eles o do Trabalho.
Numa rápida linha do tempo, Godinho Delgado lembrou que o ramo jurídico trabalhista foi resultado de um processo histórico iniciado na segunda metade do século XIX, que deu origem a ramos jurídicos de caráter eminentemente social: o processo de democratização da sociedade capitalista e das instituições, que garantiu a presença, na sociedade institucionalizada, de setores sociais que não detinham poder econômico, social e cultural. Até então, o que se chamava de democracia era um teatro das elites, como na Grécia antiga e nas cidades-estado medievais italianas, ressaltou.
O Direito do Trabalho foi pioneiro, seguido do direito da seguridade social, do consumidor e ambiental. O Direito do Trabalho veio como um mecanismo para equalizar uma relação sócio-econômica manifestamente desigual, daí o seu caráter intervencionista, explicou. Seu papel é o de fazer com que, pela norma jurídica, se alcancem condições mais favoráveis de inserção do trabalho e do trabalhador na sociedade econômica. Foi ele quem deu forma a uma ideia até então abstrata, a de justiça social.
Desregulamentação e crisesPara o ministro Godinho, especialista em Direito Coletivo e mestre em Ciência Política, a grande semelhança entre a crise atual e a de 1929 é o fato de ambas serem subsequentes a um período de hegemonia do pensamento ultraliberal e de desregulamentação da economia que tinha na Justiça do Trabalho um adversário privilegiado. Supunha-se que o sistema capitalista funcionaria com tamanha perfeição que, sem intervenções, produziria um resultado mais eficiente, inclusive quanto à distribuição de riquezas e bem-estar na sociedade, avalia.
Maurício Godinho acredita que a história mostra que essa proposta é profundamente excludente. O sistema econômico é muito eficiente, do ponto de vista tecnológico e de geração de riquezas, mas é cruel e ineficiente do ponto de vista de suas próprias necessidades e forças, e com relação à distribuição de justiça. Praticamente todas as lições do pensamento desregulamentador deram errado.
O ministro destaca que a crise atual derrubou o argumento de que a desregulamentação, verificada a partir do fim da década de 70, era uma necessidade das próprias características do desenvolvimento do sistema capitalista da época. Para que o sistema funcione bem, é preciso que as pessoas participem do sistema. Só que esta proposta de gestão sem intervenção é de exclusão e com isso ele não se reproduz a médio e longo prazos, gerando uma série de crises aparentemente ingovernáveis, afirmou, lembrando que, antes dessa crise de magnitude mundial, o sistema capitalista apresentava, a cada três ou quatro anos, uma crise que parecia incontrolável. A década de 90 foi um desastre, do ponto de vista econômico. Isso mostra uma incompetência na gestão do sistema, derivada da ausência de controles externos permanentes sobre o seu funcionamento, avalia.
Nesse contexto, qual seria o futuro do Direito do Trabalho? Trata-se de uma escolha, acredita Godinho Delgado. O futuro depende da sociedade, da democracia e do bom funcionamento das instituições, afirmou, explicando o motivo de ter começado sua exposição não com a crise de 2007, mas com a origem dos ramos jurídicos sociais. Creio que seu papel continua mais vivo do que nunca. O Direito do Trabalho é fundamental para o bem-estar das pessoas, e está provado que é fundamental para o bom funcionamento do capitalismo porque cria o mercado interno.
Carmem Feijó
TST
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