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domingo, 2 de janeiro de 2011

Correio Forense - Suficiência da resposta judicial — verdade e mito - Direito Processual Civil

01-01-2011 21:00

Suficiência da resposta judicial — verdade e mito

Um dos grandes problemas enfrentados pelo cidadão que vai a juízo em defesa de uma pretensão é a insuficiência da prestação jurisdicional, a ausência de resposta suficiente do Poder Judiciário às questões apresentadas e que constituem as premissas e os fundamentos do pedido que formula.

Em termos técnico-processuais chamamos essas premissas e fundamentos de causa de pedir. O autor da ação apresenta os fatos e os fundamentos jurídicos que justificam o pedido para que auxiliem na formação do convencimento do juiz, que dará a solução ao caso concreto. Mas nem sempre o juiz aprecia cada um dos fundamentos apresentados pela parte, elegendo algum e desprezando os demais, ou mesmo encontrando algum outro não alegado pelas partes para justificar a solução adotada.

Inconformada, a parte que viu seus fundamentos não apreciados costuma se valer de um específico mecanismo processual, o denominado recurso de embargos de declaração, cujo objetivo legal é obter a integração da decisão anterior, em caso de omissão, contradição ou obscuridade. Aqueles que militam no foro estão bem familiarizados (mas não conformados) com uma resposta-chavão a esse recurso: "O juiz não está obrigado a responder a todas as indagações e questões formuladas pela parte, quando já tiver encontrado razão suficiente para fundamentar sua decisão".

Essa fórmula, quando aplicada indistintamente, constitui um dos maiores exemplos de deturpação de normas processuais elementares e de violação às garantias inerentes ao devido processo legal. É verdade que vigora em nosso sistema jurídico o chamado princípio da persuasão racional, segundo o qual o juiz é livre para formar o seu convencimento a partir dos fatos e provas dos autos, que pode valorar como entender conveniente, podendo se valer também de fundamentos jurídicos não alegados pelas partes.

Já se foi o tempo dos chamados Juízos de Deus, quando a prova da inocência passava, por exemplo, pela capacidade que o acusado tivesse de sair ileso de uma fogueira ou de salvar-se do afogamento, a demonstrar que Deus o julgava inocente. Nosso direito contemporâneo também repudia o sistema da prova tarifada, pelo qual as provas têm valor predeterminado e ao julgador cumpre considerá-las objetivamente, como um autômato. O depoimento da mulher não vale menos que o do homem ou vice-versa; mas não valerá o depoimento de quem, para o magistrado, estiver mentindo.

O princípio da persuasão racional é, pois, uma garantia fundamental do cidadão, que deve contar com a plena liberdade do magistrado para decidir. Mas deve ser aplicado em sua plenitude, que delimita a liberdade do órgão jurisdicional: se é livre para julgar de acordo com sua consciência jurídica a partir dos fatos que lhe são apresentados, o juiz está obrigado a motivar a sua decisão, isto é, a explicar às partes as razões pelas quais preferiu uma solução e não outra, porque deu mais valor a uma prova do que a outra e assim por diante. Aliás, não por outro motivo esse princípio, positivado no artigo 131 do Código de Processo Civil, é também conhecido como princípio do livre convencimento motivado.

Compreendido o raciocínio lógico desenvolvido pelo juiz, as partes poderão se conformar com a solução ou, inconformadas, poderão impugná-la de maneira específica por meio dos recursos cabíveis. Também a própria sociedade, que é a destinatária indireta e última dos atos estatais, poderá fiscalizar as opções ideológicas, políticas, éticas e jurídicas utilizadas pelo julgador para editar o provimento.

E o caminho lógico que o juiz deve percorrer para explicar a solução que deu ao caso concreto deve passar também e necessariamente pelo exame das causas de pedir apresentadas pelas partes. Não eleger uma causa de pedir como fundamento da decisão não autoriza o seu sumário desprezo, ou sua rejeição implícita. O juiz só está dispensado de apreciar todas as causas de pedir do autor em uma única situação: se já tiver encontrado fundamento suficiente para julgar a demanda procedente. Jamais em caso de improcedência. Uma causa de pedir não apreciada equivale a uma ação não julgada. Não se confundem argumentos com causa de pedir. O juiz não está mesmo obrigado a responder a todos os argumentos da parte, desde que digam respeito a uma mesma causa de pedir, já apreciada. Tecnicamente, os argumentos são os fatos não essenciais, acessórios à causa de pedir.

A adequada motivação é fator de legitimação da decisão jurisdicional como ato do Estado e exerce papel fundamental na missão pacificadora atribuída ao Poder Judiciário. Portanto, é hora de separar a verdade do mito. A contrapartida da liberdade de julgar é a adequada motivação, que não é definida discricionariamente pelo juiz, mas decorre da Constituição e das leis processuais às quais, aqui, sim, está ele inteiramente vinculado.

Autora: Daniella Zagari

Advogada, sócia do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice, mestre em Direito Civil.

Fonte: Correio Braziliense


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